Visita a doente nas missões

Visita a doente nas missões

 

Certa vez numa Missão, um frei estava pregando em uma comunidade rural a uns 25 quilômetros distante da cidade. Capela de madeira, simples e bem antiga. Comunidade pequena com aproximadamente 20 famílias.

Estava ele à tarde na capela, lendo um livro que falava sobre a espiritualidade pastoral, quando recebeu a visita de um rapaz. O rapaz chegou montando num cavalo que já apresentava sinais de cansaço, apresentava um semblante de preocupação. Seu rosto parecia cansado, envelhecido e com sinais do sol que enfrentava todos os dias no trabalho da roça. Pediu ao frei se ele poderia visitar sua mãe que estava doente. O frei disse que sim e combinaram para que  viesse buscá-lo às 18horas e 30minutos.

No horário combinado, outro jovem veio buscar o frei. Desta vez com um fusca. O fusca era branco, porém estava todo sujo de barro, parecia bege ou marrom de tanto barro. Era uma região totalmente esquecida pelo poder público. As estradas rurais estavam totalmente sem conservação.

 O frei entrou no fusca que mais parava do que andava. Na subida parecia que o fusca não conseguiria vencer o desafio. Nas descidas o motorista soltava a marcha para economizar combustível… O caminho estava sendo com muita emoção…rsrsrs. Andavam, andavam e o lugar não chegava.

O motorista – que era apenas um vizinho da doente – dizia: estamos quase chegando, é logo ali!!….mas nunca chegava.

Durante todo o trajeto encontraram apenas duas casas, muitas plantações de milho, pastos e algumas matas ainda virgens. Segundo o jovem naquela região já moraram muitas famílias, mas quase todas foram para Curitiba a procura de trabalhos.

No caminho o frei fez algumas perguntas sobre a doente ao jovem que foi buscá-lo. Já que este apenas respondia o que se perguntava. Foi então que o frei descobriu que a doente tinha cinqüenta e cinco anos de idade, estava doente a muito tempo e tinha ido ao médico a seis meses atrás. O médico pediu alguns exames, mas como não tinham dinheiro para pagá-los, esperaram vários meses para fazê-los pelo SUS, e ainda não tinham recebido o resultado. O jovem disse: que tinham levado a senhora a uma benzedeira e segundo ele, ela havia melhorado um pouco. Disse que a senhora tinha problema no pulmão, sentia muita falta de ar, não conseguia quase caminhar.

Depois de uma longa viagem chegaram à casa onde estava a senhora. Já era quase 20h da noite e estava escuro. Quase não dava para ver como era o ambiente onde ficava aquela casa, mas percebia-se que havia muito mato por perto, muitas árvores, e apesar de ainda ser cedo, ouvia-se muitos barulhos de grilos, coaxar de sapos, bem ao longe um berro de vaca e os latidos de alguns cachorros que pareciam ser mansos.  

Era uma casa de madeira, pequena, janelas fechadas e não havia nenhum sinal de luz elétrica naquele local. O frei observou o ambiente, e não ouviu nenhuma conversa. Também ninguém apareceu para acolhê-lo. Então foi entrando pela cozinha, quando o rapaz que havia feito o pedido apareceu vindo de um dos cômodos da casa e disse que sua mãe estava no quarto.

Entrou no quarto e encontrou a senhora deitada na cama. Morena, magra, com os cabelos bem grisalhos e aparentemente à muito tempo sem corte. No quarto havia uma lamparina e quatro pessoas em volta da cama. Na parede, na cabeceira da cama um crucifixo. Num altarzinho, do lado da cama uma pequena imagem de Nossa Senhora Aparecida. O frei ficou alguns minutos em silêncio, ninguém falava nada e a senhora estava com os olhos fechados.

Até que o rapaz disse: frei, minha mãe morreu às 19h. Fazia uma hora que ela tinha morrido. O frei perguntou se tinham pedido o atestado de óbito e o rapaz disse que não precisava!! Que eles iriam enterrá-la e que depois providenciariam.

Então o frei fez uma oração, benzeu o corpo e foi reconduzido para a capela com o mesmo fusca…. Mais alguns quilômetros de muita emoção.

O que lhe chamou mais a atenção foi a naturalidade com que aquelas pessoas lidaram com a morte. Num mundo que tenta esconder de todas as formas a crueldade da morte, ainda há quem vive em harmonia com a natureza e encara a morte como um processo natural da vida. Não que esteja certo o fato da mulher não ter sido medicada e acompanhada em sua doença, mas precisamos ter fé na ressurreição e não ficarmos tão apegados às pessoas a ponto de não deixá-las partir.

 Existe uma frase que diz : “amar é deixar partir!”

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  1. Este texto relembrou um momento muito difícil da minha vida e posso dizer que realmente amar é deixar partir, mas como somos egoístas demoramos a entender… Senti isto quando perdi meu bebezinho….e somente quando deixei partir, acho que provei meu amor de mãe….Hoje tenho um anjinho…Gosto muito dos seus textos, pois eles são reais,pé no chão. Continue escrevendo, Deus lhe deu um grande dom…
    Paz e bem !!!
    Cláudia


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